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Strogonoff, uma pérola da culinária soviética

Sou um cara das antigas. No meu tempo, a Rússia era apenas uma província da URSS, que respondia pelo pomposo, vistoso e lustroso nome de União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Aliás, não respondia não, porque tinha uma tal guerra fria pegando, todo mundo com medo da bomba atômica, do MIG 29 (quem nunca assistiu Top Gun que atire o primeiro F-16), da estação MIR e da cadela Laika. E eles não respondiam nem pros Ianques, pra quem todo mundo respondia, então quem sou eu de falar que eles respondiam por alguma coisa..

Naquele tempo, os nossos camaradas, além de beber vodka, mandar foguete com cachorro pra lua e infernizar os americanos, se alimentavam alegremente com um delicioso prato que responde pelo nome de строганов.

Entendeu? O prato se chama строгановстроганов é uma coisa que se come. Não se fala, mas se come. A menos que você tenha feito parte da KGB num passado remoto (e se fez eu tenho medo de você), imagino que não consiga pronunciar o nome do prato. Cтроганов não é como feijão, arroz... Ou até mesmo Feijoada, que qualquer gringo sabe falar. Eles vão no boteco, falam "Feixoara" e o prato vem. Se eu ou você, ou nós dois juntos, formos à Rússia (prefiro chamar de União Soviética, mais charmoso) e pedirmos um строганов, ou ficamos com fome; ou levamos um cacete.

Imaginemos um tal de Sr. Dimitri Vladivostok (joguei muito War na adolescência).  Camarada Dimitri estava a largar a URSS querida e lançar-se ao mar rumo ao Brasil, como tantos fizeram nos tempos pós-segunda-guerra. Munido de toda a vodka que conseguia carregar, o Camarada Dimitri aportou nesta terra onde se plantando tudo dá, e começou sua pacata vidinha numa igualmente pacata cidadela deste nosso Brasil varonil. Solícito com os amigos e vizinhos, o simpático Camarada sempre convidava a todos a saborearem sua deliciosa строганов, receita cuidadosamente passada de mamuska em mamuska pela sua família, há séculos. E ninguém comparecia.

Rápido como uma Perestroika, Dimitri logo percebeu que as pessoas não iriam querer saborear um alimento do qual não entendiam uma única letra do nome. Ok, todos sabemos que строганов começa com C, mas essas línguas são muito loucas e de repente o C tem som de Y, ou de 9. Então ele colocou o wladimir e o mikhail tico e o teco pra funcionarem e numa bela tarde ao som de raul seixas... ele, que já passou pelos quatro cantos do mundo procurando, foi justamente num sonho, que ele lhe falou: STROGONOFF é a alcunha da sua oferenda, meu caro Dimitri.

Não seria nada incompreensível como строганов, não abandonaria as suas raízes bolcheviques, não lhe faria um traidor de stalin, mas ao mesmo tempo era uma palavra que todo mundo  conseguiria pronunciar. Pois foi assim que o nosso destemido filho da Mãe Rússia saiu pelas ruas da pacata cidadela do nosso Brasil varonil gritando aos quatro ventos "Venham comer o meu Strogonoff!!!!". E foi um sucesso. Alguns estavam curiosos com o alimento, outros com pensamentos impuros em relação ao nosso camarada, mas como este estava com os cornos cheios de vodka, o resultado final é que todo mundo saiu feliz.

Agora vamos parar com essa enrolação e mãos à obra preparar essa verdadeira delícia da culinária Moskovita.

Por falar em Moskovita (R$6,90 aqui no Super Vizinho, mercadinho perto de casa), abra logo uma dose de vodka e façamos um brinde ao som das trombetas. Cantando comigo:

С помощью транслитератор из букв латинского алфавита получаются буквы кириллицы, иврита, белорусского, греческого, или украинского алфавитов. Этот транслитератор задумывался как сервис для русскоязычных жителей стран , находящихся за границей и желающих переписываться на родном языке. Если кто-нибудь говорит "Я пользуюсь транслитом", то всем понятно - речь идет. Еще его называют просто

«транслит» или  желающих переписыват!!!
«транслит» или  желающих переписыват!!!
«транслит» или  желающих переписыват!!!
«транслит» или  желающих переписыват!!!

Cantou? Então bebe logo essa vodka e comecemos a nos embriagar com mais uma receita com o padrão de falta de qualidade Gato na Grelha:

A primeira coisa que você vai precisar é de um bom pedaço de carne e uma faca afiada. Mas que carne? Você pode preparar um strogonoff maneiro com vários tipos de carne (patinho, acém, alcatra...) Fuja das carnes muito gordurosas, que vão fazer do seu strogonoff um poço de banha, e fuja daquelas carnes que têm muita fibra, como o contra-filé. Na verdade, quem vai definir que tipo de carne você vai usar é o seu bolso. Patinho é barato, alcatra já nem tanto mas também não é uma fortuna, enfim. E como estamos falando do SEU bolso e não do meu, vou logo chutar o balde e te deixar cheio de carnê do açougue pra pagar: Hoje vamos de filé-mignom, parceiro.

Sou muito fã desse corte. Eu e a torcida do curintia, do framengo e do parmera, né? É uma carne muito macia, muito saborosa, e que mantém o sabor e maciez mesmo sob condições extremas. E vamos colocar nossa carne sob condições marromeno extremas. Então é bom ela aguentar o tranco.

Nada disso de chegar no açougue e pedir aquele picadinho pronto pra strogonoff. Ali eles cortam do jeito que querem, pedações grandes, e você nunca vai saber se tem um filé de gato ali no meio. Então larga mão de preguiça e bora lá picotar nosso filé mignom. Pra nossa receita, uma peça de meio quilo já é o suficiente. Principalmente porque o FM (dá muito trabalho ficar digitando o tempo todo. Vamos chamá-lo de FM) é uma peça muito limpa, praticamente sem nervos ou gorduras, então você vai aproveitar praticamente 100% desse meio quilo.

Aí, merrmão.. o processo é o seguinte: afia a tua faca, concentra no que tá fazendo e picota a carninha até obter meio quilo de pequenos pedaços do tamanho de meio polenguinho. Teve infância, compana? Então você sabe do que eu tou falando. Picota mesmo, sem técnica, sem critério. Se você já esquartejou uma pessoa, saberá como fazê-lo. Se não esquartejou uma pessoa, também saberá. Foca na miopia e polengo na mente que você consegue.

Agora é hora de temperar o FM picado. Você ainda tem uma trabalheira pela frente, e aí a tua carne vai pegando gostinho do tempero, o que fatalmente vai se transformar em mais amor no teu prato

ATENÇÃO: Isso foi uma PIADA. JAMAIS coloque sazon num filé-mignon!! Nem fora dele. Não gosto desses temperos de gultomato monossódico, não. Enfim, gosto pessoal. Se você quiser colocar sazon, coloca. Mas não me conta que a gente perde a amizade.

Você pode temperar o seu FM como quiser. Pelas experiências que eu já tive, recomendo apenas um pouquinho de uma pimenta tipo tabasco, pimenta do reino e sal.

Não recomendo usar temperos liquidos em abundância
, porque você vai ter que fritar essa carne depois. Muito liquido pode miar a sua fritura e você acabar cozinhando a carne. Também não recomendo temperos com folhas.. Uma vez eu usei orégano. O sabor até ficou legal, mas o orégano soltou da carne, obviamente, e ficou boiando pelo strogonoff, dando um aspecto meio esquisito. Nem pimentas em fruta, pelo mesmo motivo. Uma biquinha, por exemplo, vai ficar boiando no molho depois... Estranho.
Vai de sal, pimenta do reino e tabasco que é sucesso.

Agora vai mexendo até o chão na boquinha da garrafa tudo aí e deixa o FM quietinho. Vamos à próxima:

Aproveita que a faca tá afiada, que você ainda tá sóbrio (eu acho) e que a animação tá te contagiando e tome mais uma dose de vodka picote uma cebola. Picota pequeno, compadre. Lembra sempre com essa sua cabeça de vento que você está fazendo um strogonoff de FILÉ MIGNON, e não um strogonoff de cebola. Pega duas panelas, e divide essa cebola picada em duas partes. Uma pra cada panela.

Aí o mais fino, elegante e sincero leitor desse blog me pergunta: "Mas por que duas panelas, meu caro escriba?"

E eu respondo: "Научиться пользоваться еще проще с помощью, наглядной!", o que significa: "Para fazermos um belo e saboroso arroz branco, camarada!". Mas aí surge um problema daqueles capazes de ruborizar o mais sem-vergonha dos leitores: Sim, eu sei fazer arroz. Sim, eu sei cozinhar coisas saborosas, elaboradas e elas costumam ficar deliciosas.... Menos o meu arroz. Meu arroz é péssimo. Em todos esses anos nessa indústria vital, eu nunca consegui fazer um arroz que não ficasse uma papa. Daqueles que você puxa um grão e vem a panela toda, sabe? Então. Por este motivo não tem nenhuma receita de arroz aqui no blog (tem algumas, mas tem migué. Lê que você vai entender). E por isso eu sempre pulo a confecção deste alimento nas minhas receitas. Assim como o farei novamente. Agora. Faça o arroz como quiser, ok?

Por favor, aceito dicas inbox.

Voltemos à panela do strogonoff, que é a única que nos interessa hoje. Aproveitando essa picotagem toda, picota bem pequeno E CUIDADO COM ESSE DEDO AÍ um dentinho de alho, daqueles que não são nem minúsculos, nem imensos. Nem o dente de leite do seu filho, nem o sabre do mamute. Você entendeu.

Vodka. Tome vodka. Se for balalaika, tome um pouco menos.

Tomate, chegou tua hora. Pode te preparar pra sofrer a mais desumana das torturas. Embora o tomate não seja humano. Mas ele é um vegetal que na verdade é uma fruta, e como tem muito humano que também é fruta, considero sim o tomate um humano e bora pra tortura.

Sabe tirar a pele do tomate? Não, você não vai descascá-lo como a uma laranja. Isso aí não tem a menor graça e  gente tá aqui pra ver tomate sofrer. Então pega uma panela, enche de água e bota pra ferver. Quando estiver a pino, jogue, sarcasticamente, o tomate lá dentro. Delicie-se com os seus gritos e súplicas de dor. Mas fica de olho, esses tomates são muito espertinhos e derretem rápido. E ainda vamos judiar um pouco mais. Tá de olho? A pele do tomate já fez algum rasgo? Isso mesmo, a pele do nosso prisioneiro vai abrir em algum ponto. Quando isso acontecer, tira ele da água quente. Agora olha que cruel: deita ele na sua tábua e vai arrancando cuidadosamente a pele, enquanto ele te conta toda a verdade. A pele se solta rapidinho e neste momento você terá um tomate sem pele. E sem vida.

Então pára de maldade, picota o tomatinho e guarda em cima da tábua mesmo.

Recapitulando:
1 - Picotamos uma linda peça de FM e temperamos. Ela tá em algum lugar da sua cozinha esperando por você. Pode ser em qualquer lugar, menos dentro da panela, ok?
2 - Picotamos meia cebola, esta sim está dentro da panela.
3 - Deixamos um alho banguela e o resultado está picotado dentro da panela.
4 - Temos um tomate sem pele, sem vida e sem dignidade picotado em cima da tábua.

Perfeito. Agora a coisa vai começar a cheirar bem...

Regue a cebola e o alho com azeite até cobrir o fundo da panela (tou acreditando que você pegou uma panela compatível com meio quilo de carne, certo?), e acenda, finalmente, o fogo debaixo dela.

O refogado é um dos momentos mais sublimes da culinária. Por isso, enquanto a cebola chia dentro da sua panela, tome mais uma vodkinha. Não sei você, mas eu já estou começando a ficar meio bebum. Bola pra frente.

Quando a cebolinha começar a ficar amarelinha, parecendo meio transparente, é a hora do FM entrar no jogo. Taca lá pra dentro todo o FM que você picotou. Dá uma mexidinha pra ele fritar legal.. Com o tempo, a carne vai começar a soltar um líquido e fazer daquilo um caldo com um cheiro delicioso. Pra saber se a carne tá no ponto... Tira uma e come, ué. A carne não pode estar mal-passada de jeito nenhum, porque a partir de agora, não vai mais ter fritura. Quando estiver no ponto, joga lá dentro o tomate. Dá uma mexidinha e deixa.. O tomate tende a se dissolver, ou a ficar bem molinho.

Ah, esqueci de um cara importante: O Champignon. Sabe aqueles vidrinhos pequenos que vende no mercado, com campignon já picado? Então, taca um dele pra dentro. Se não estiver picado, pique. É importante ele ser pequeno. Só toma cuidado e não deixa aquela água da conserva cair dentro da sua carne.. Ela é salgada e cheia de conservantes, vai estragar a receita. Cuidadaê!

Agora um toque que eu, particularmente, gosto muito: Vai na geladeira, pega aquele catchup que você tem lá e manda uma golada responsa pra dentro. É  mais ou menos a quantidade de catchup que você colocaria num X-Salada inteiro. Você vai saber o quanto.


Se você tem um catchup de qualidade na sua geladeira, tanto melhor. Se não tem, dá uma busca aqui no blog que tem uma receita maneiríssima de catchup da melhor qualidade.


Mexe. Tá ficando com um molho vermelhinho? É disso que eu tou falando, meu compana. Se você achar que o teu molho não tá lá muito vermelho, tá meio esquisito, pode jogar um pouco de molho de tomate pra ajudar.. Imagina que você vai jogar uma lata inteira de um treco branco lá dentro, e o resultado final do strogonoff é uma cor meio laranja.. Então bota essa palheta de cores pra funcionar e corrige o quanto julgar no molho.

Se você for daltônico, pensa que teu molho tem que estar com um azul bem maneiro, e o resultado final do estrogonoff é um negócio meio amarelo-limão. Aí você pega aquele molho de tomate bem lilás que tem na sua geladeira e boa sorte aí pra ir corrigindo as cores. Enfim.

Mas que treco é esse que vamos colocar? É Creme de Leite, meu caro amigo.. Aquele que sai do peitinho da vaca, que passou por um processo show de bola que eu não sei qual é, mas no final o qu era pra ser comida de bezerro vira um treco bem cremosinho...

Só que você não pode simplesmente sair jogando creme de leite pelo mundo assim.. Tem que tomar alguns cidados antes.. O creme de leite pode talhar com a temperatura, o fogo aceso, etc... Então desliga o fogo, joga o creme de leite lá dentro, mexe e pronto.

Tá feito o seu Strogonoff!

Camarão na moranga

O calendário gregoriano é mesmo uma coisa de louco. Caso o nobre leitor não saiba, gregoriano é o calendário que nós utilizamos, onde cada semana tem 7 dias, cada ano tem 12 meses, cada dia tem quase 24 horas e quase todo ano temos 365 dias.

O papa Gregório XIII inventou tal aparato para corrigir o falho calendário Juliano, desenvolvido anteriormente pelo incauto romano Júlio Cesar, que já deu nome a um monte de gente, mas perdeu a autoria do calendário e teve de aceitar essa pro papa. 

A loucura começa pelo fato de termos um calendário feito por um papa. É como se tivéssemos uma estrada construída por um criador de javalis, ou uma cidade arquitetada por um garçom. Não que o garçom não tenha seus talentos, mas eu aaaaacho que construir cidade é uma coisa meio complexa. Enfim.. A segunda loucura é que o seu Gregório inventou um calendário falho pra substituir um calendário falho. Taí o ano bissexto que não nos deixa mentir. Ou seja: deu um chega pra lá no imperador e até hoje temos que trabalhar um dia a mais de 4 em 4 anos.

E, já que o assunto aqui é gente que faz caca, venho eu admitir que sim, malacamente fiz uso da incompetência gregoriana pra assumir que tive, nos últimos meses, uma semana tão longa que faria corar Maias e Astecas, com seus calendários assombrosamente finalizados neste malfadado ano de 2012. Se o leitor vislumbrou o post passado, pode notar que, dizia eu, que "semana que vem" redigiria a doce história de um camarão que penetrara (ui) na moranga para produzir uma quente e cremosa gororoba, porém jamais imaginava que passaria por uma semana que começaria em janeiro, e terminaria quase em abril. Culpa do seu Gregório, o XIII.

Pois bem, já que começamos com as pataquadas astronômicas do bondoso papa, vamos nós nessa aventura que o querido leitor vai ver com seus próprios olhos como se vai do céu ao inferno numa única receita.

O camarão na moranga é uma comida típica brasileira, e basicamente compreende uma das mais improváveis combinações gastronômicas já imaginada: Trata-se de uma gororoba de camarão com catupiry enfurnada dentro de uma doce e assombrosa abóbora. 

E vem comigo que a coisa por aqui vai ficar feia.

Primeiro, vamos à gororoba de camarão.

Tudo começa, como quase tudo em culinária, no bom e velho refogado. Se o leitor não sabe do que se trata, é uma fritura de cebola, tomate e alho picados. Mas vamos fazer esse treco direito.

Picota bem pequenina uma cebola média. Tira a casca, faz a coisa direito. Sem chorar, cowboy. Reserva esse trem aí num pote. 

Agora picota uns 2 ou 3 dentes de alho. Reserva em outro pote. Vais sujar um monte de louça mesmo, depois vc se vira com ela.

Picota uns 2 tomates grandes também. Tendo em mente aquela coisa chata dos coliformes fecais, recomendo seriamente que dê uma lavada nos tomates antes da lavagem picotagem*.

* adendo: eu havia escrito que deviamos lavar o tomate antes da lavagem. Os sábios leitores me avisaram do grande erro lógico que me acometera. Agradecido!

Aí você pega uma panela grande (não esquece que vais jogar catupiry, camarão e mais um monte de coisa lá dentro), joga azeite até cobrir o fundo e deixa dar uma esquentadinha. Quando achar que tá meio quentinho, taca a cebola lá dentro. Uma folha de louro ajuda. 

Quando a cebola começar a ficar amarelinha e meio transparente, joga o alho e mistura bem. O alho frita rapidinho, então fica esperto nos pontos pretinhos na panela. Quando o primeiro pontinho preto aparecer, fica esperto e taca lá dentro todo o tomate que já tenha picado. Se não deu tempo de lavar, manda com coliforme e tudo, o que não mata, engorda.

Dá uma mexida aí nessa coisa, vc vai notar que os tomates começam a se desfazer. Vai mexendo gostosinho gostosinho rebolando até o chão [/leandro e leonardo].

Tenha em mãos um belo e glamouroso kilograma de camarão limpo. Pode ser qualquer camarão, e a razão diretamente proporcional entre o prejuízo no seu bolso e o tamanho do camarão impacta diretamente no sucesso da sua receita. Desde que esteja limpo, sem pele, sem rabo, sem cabeça e sem pezinhos. Tirou tudo isso, pesou 1kg, é disso que a gente tá falando.

Manda esses caras pra dentro da panela. Mexe mexe que é bom de novo.

O camarão começa a perder um monte de água, e eles vão diminuindo de tamanho, enquanto você acompanha, literalmente, o seu dinheiro evaporar. 

Primeiro, faz um monte de líquido na panela. Depois, esse líquido vai evaporando e o caldo começa a ficar mais grosso. Tamos chegando no caminho.

Se você tiver um cubinho de caldo de camarão, taca dentro. Se não tiver, taca um de legumes. Se não tem de legumes, nem pensa em mandar aquele tempero de feijoada, sazon ou caldo de carne. Aquele lance da propaganda que todo mundo acha gostoso e sai gritando que É O AMOOOOOOOR só acontece no comercial. Se você mandar um caldo de carne no camarão, estragou o camarão. Se não tem caldo nenhum, ao final da receita vc acerta o sal e pronto. 

Entornando o caldo, o que temos aqui é uma panela fervilhando de camarão, tomate, cebola, alho, tempero e água. Joga lá dentro um vidrinho de leite de coco, isso aí dá um agrado ímpar a essa receita.

Quando der uma boa evaporada no seu rico dinheirinho na água do camarão e o caldo estiver ficando grosso mesmo, joga lá dentro metade de uma daquelas bandejas de catupiry. Pode ser uma bisnaga, enfim. O ideal mesmo é aquele catupiry que vem no potinho (que parece uma bandeja, que antes era de madeira), mas pode ser o de bisnaga.

Mais uma vez, a razão entre o quanto pagou no queijo e o quanto sua receita vai ficar gostosa é diretamente proporcional. Resumindo: não manda aquele "requeijão biriba" pra uma receita cheia de camarões. Manda catupiry de verdade, ou alguma coisa BOA lá pra dentro.

Ok, feito isso, mistura um pouco e deixa. Vamos pra abóbora.

Eu, sinceramente, nunca entendi os americanos. O fato deles acharem que a capital do Brasil é Buenos Aires, eu até aceito. O fato deles comerem pasta de amendoim e omelete de manhã, até dá pra entender. O fato deles não gostarem de futebol e acharem o máximo jogar taco no estádio, passa. Mas esse lance muito louco de ter medo de abobora eu não entendo MESMO. Tá certo que é helloween, aquela coisa toda, mas poxa.. uma abóbora, sempre vai ser uma abóbora. Um vegetal, como cenoura, pepino e acelga. Embora acelga seja meio esquisita mesmo.

Pra provar que esse lance de medinho é coisa de maricas, cá vamos nós bancar o sacripantas e retirar o cérebro da fruta lá de dentro.

Você pega uma faca afiada, e arranca a tampinha do alto da cabeçona dela. Imagina uma tampinha redonda, começa a cortar. Tá feito. 

Mete o mãozão lá dentro (dá uma lavada, né fanfarrão), retira todo o conteúdo e pronto. Você vai ter uma abóbora oca, inofensiva, incapaz de assustar o mais frágil dos barak obamas. 

E antes que você possa falar "Shake Your Ass, mr. Pumpkin-head", passe a mão no óleo da sua cozinha e esfregue nas paredes internas da cabeçona de abóbora ali. Pouco óleo, é só pra dar uma molhadinha.

Pra que? Pra passar batom, de que cor? de cor de violeta. Na boca e na buchecha Pra abobora em si começar a ficar molinha.

E por falar em molinha, saca que moleza: mete a aboborona dentro do seu microondas e deixe lá uns 2 minutos. Abre, cuidado pra não queimar esse dedão duro. Se ela tá ficando um pouco mole, tira de lá. Se ainda tá muito durenga, vai deixando mais um minuto, conferindo o estado da fruta com frequencia.

Aqui vem o grande momento da sua abóbora. Pensa comigo:

At the blue corner, você tem uma abóbora acéfala, meio molenga. E at the red corner você tem um líquido muito louco de camarão e mais um monte de coisa. A missão aqui é colocar um dentro do outro, preferencialmente o camarão dentro da moranga, sem nocautear a sua receita e sem golpe abaixo da linha de cintura.

Se você não tomar cuidado, sua abobora vai quebrar e todo o seu dinheiro camarão vai pelos ares pelo chão.

Portanto, não faça como eu fiz, e coloque uma bandeja debaixo da abóbora. Feito isso, deposite no fundo da abóbora o outro meio pote de requeijão. Feito isso também, jogue aquele líquido todo de camarão e coisas. Isso tudo vai, agora, pro forno. Não se esqueça da lambança que acontecerá caso esqueça da bandeja debaixo da abóbora.

Veja com seus próprios olhos:


sim, leitores. isso aconteceu comigo.
aí aprendi a forrar a abóbora, como podem ver na de cima.

Recolhido do chão, a família nem percebeu o gostinho de ODD. 
malandragem também faz parte da culinária, vai aprendendo com o tio.

Agora, deixe no forno o tempo de você tomar umas duas cervejas, retire com todo o cuidado do mundo e seja feliz.

Como preparar uma FEIJOADA de mestre

Segunda feira chata como sempre, final de expediente, você aí dando aquela enrolada no trabalho, dia das mães já passou, bin laden bateu as barbas, e cá estamos nós, eu e você, já pensando na lambança gastronômica do final de semana. E, se o assunto aqui é esse, lambança rima com lembrança e vem comigo nessa rima pobre relembrar os primórdios da nossa culinária, chafurdando no caldeirão [/luciano hulk] de um dos mais tradicionais instrumentos da nossa cultura.

Assim como o futebol, o samba e a bunda, esse belo país em formato de bisteca também é conhecido no mapa-mundi pela Feijoada.

A história da feijoada todo mundo conhece, mas não custa dar a nossa versão relembrar: No século dezenove - eu odeio números romanos. odeio romanos [/asterix], a rapaziada mais abastada, assim como hoje em dia, não tinha lá muito apreço por pegar no batente, não. Assim como muito político que a gente conhece, nesse mundão sem fronteiras, quem tem dinheiro não faz, manda fazer. No século 19 as coisas eram ainda mais cruéis, vai vendo.

O coronel Coriolano, que aliás tem um belo nome, não tinha muito apreço pela fadiga. Gostava mesmo era de contar os seus contos de réis, devidamente ornamentado pela sua bombacha sobre a carroagem que o levava pela pradaria. Coronel Coriolano era um cara de vocabulário arcaico, por isso profiro aqui palavras tão prolixas.

Porém, para multiplicar os seus contos de réis, alguém naquela fazenda tinha que trabalhar, e nós aqui já sabemos que não seria o coronel Coriolano. Mas se o distinto senhor possuía providências, logo poderia comprar alguém para fazer isso no lugar dele, não? Pois foi assim que o coronel Coriolano procedeu, e logo aportou em algum local desse Brasil varonil um navio cheio de negros, feitos escravos.

Coronel Coriolano, um grandecíssimo calhorda, gordo como um porco, ficava ali, deitado eternamente em berço esplêndido, enquanto os negros trabalhavam no lugar dele.

Aí, o coronel mandava um negro abater aquele porco gordo (o bicho, não o coronel), retirava as partes nobres e mandava pros negros o que sobrava. Pés, orelhas, rabo.... E, gordo como um porco (o coronel, não o bicho), ria-se das desgraças daqueles pobres negros que, sem a menor culpa no cartório, sofriam as mazelas da escravidão no seu lugar.

Se a vida lhe der um limão, faça uma limonada, já dizia o velho ditado. Se a vida lhe der um feijão, faça uma feijoada, diz o velho blogueiro. Se a vida lhe der um violão, faça uma feijoada. Se a vida lhe der um irmão, faça uma feijoada. Se a vida lhe der um sermão, faça uma feijoada. Se a vida lhe der um caminhão, faça uma feij... Você entendeu, aconteça o que acontecer, faça uma feijoada. E foi o que os escravos fizeram: juntaram todo aquele resto de porco, meteram dentro de um feijão e assim tava criado um dos pratos mais incríveis da nossa gastronomia.

E se for pra fazer uma feijoada, siga o procedimento abaixo. E, caros leitores.. o procedimento é longo e a labuta é árdua.

Portanto, agradeçamos à Princesa Isabel que, ao contrário de todas as outras princesas da história, fez alguma coisa realmente relevante e aboliu a escravidão. Escravidão esta que nem deveria ter existido, mas como algum idiota achou que seria legal dar um pulinho na África e cometer um dos maiores erros da história da humanidade, ainda bem que nós tínhamos a dona Isabel, que azedou com a graça do coronel e de mais um monte de aproveitadores, safados e vagabundos e botou todo mundo pra trabalhar.

Agora vamos ao procedimento. Estamos levando com consideração que você vai fazer uma feijuca pra um monte de gente, portanto a quantidade de ingredientes vai ser colossal. Prepara que você vai, literalmente, suar sangue.

Pela primeira vez na história desse blog, vamos abrir mão da sacanagem de simplesmente ir jogando ingredientes a esmo no meio do texto, e vamos fazer uma listinha com tudo o que você precisa ter em mãos pra preparar uma boa feijoada.


Hora do prejuízo. Prepara o pelego, monta no pangaré e dirige agora essa carcaça surrada até o supermercado mais próximo. Pegue um carrinho grande e senta que lá vem a história.


  1. Esquece o bacon defumado. Compre uns 400g de barriga de porco, aquela crua mesmo;
  2. Se não tiver arroz na sua casa, compre. Feijuca sem arroz é como mulher na TPM: não adianta o quão você se esforçar, você não vai conseguir comer;
  3. 1kg de feijão preto;
  4. Salsa;
  5. Alho;
  6. Umas 4 cebolas grandes;
  7. Um maço de couve-manteiga, que não tem nada de manteiga, mas assim foi denominada;
  8. Uma peça de costela de porco de uns 2kg;
  9. 1/2kg de carne de charque, um tipo de carne seca;
  10. Duas orelhas de porco, daquelas salgadas;
  11. Um rabo de porco, igualmente salgado;
  12. Um pé de porco, salgadinho, salgadinho, só no sapatinho [/só pra contrariar];
  13. Uma linguiça portuguesa defumada;
  14. Uma linguiça calabresa também defumada;
  15. Dois paios, defumadinhos defumadinhos, só na fumacinha [/bob marley];
  16. Um codeguim, seja lá o que isso signifique, mas já chegamos lá;
  17. 1kg de bisteca de porco em fatias;
  18. 1/2kg de farinha de mandioca;
  19. 6 limões;
  20. Pimentas diversas, se vira;
  21. Colorau;
  22. Umas folhas de louro;
  23. Azeitonas.

Já deu pra perceber que isso aqui vai dar trabalho, não é? Assim como já deu pra perceber que o preju aqui vai ser grande, não é? Pois é, mas isso aí serve pra alimentar um pelotão. Portanto, se você pretende alimentar um pelotão, siga os procedimentos e leve o prejuízo.

O primeiro passo é lavar 1/2kg de feijão preto. E como lava? Mete num pote, abre a torneira e deixa passar água. Parceiro, meu lado ogro me diz que esse negócio vai ferver tanto, mas tanto, que você nem precisa se preocupar com bichos ou agrotóxicos. Chora, Doutor Bactéria, que dessa vez a gente vai levar os anticorpos da galera ao limite!

Lavado ou não, pegue o 1/2kg de feijão e mergulhe na água. Pega um pote bem grande, joga o feijão e manda água pra dentro. Sabe aquele lance que a gente chafurda na cerveja e fica todo inchado? Então, acontece o mesmo com o feijão. Então, pensa num pote grande, porque os grãos vão crescer bem. E enche bem de água. Deixa isso quietinho e vai acender a churrasqueira.

Churrasqueira??? O mais sensato dos leitores certamente vai pensar que este blogueiro está viajando na maionese, na mostarda e no catchup, mas não: eu não estou viajando.

Vamos por partes, já diria o jack estripador, embora eu prefira muito mais o jack daniels.

Pé, orelhas charque e rabo do porco
Como lidar com essa verdadeira carnificina suína salgada e depilada que tá aí na sua frente? É, essas partes são meio bizarras quando cruas, mas não tem jeito: você tem que meter a mão nesse trem aí. Abre a torneira, lava bem pra tirar o sal e chafurda numa bacia grande, cheia de água. Você tem que fazer isso pra tirar o sal dessas peças.. Se deixar do jeito que tá, a sua feijoada vai ficar mais salgada que o mar morto. Se não entendeu a piada, vai pro goooooogle. É importante deixar de molho umas 5 ou 6 horas, trocando a água de hora em hora. Fica atento no silvio santos, passou o resultado da tele-sena, troca a água.

Costela e barriga
Você acendeu a churrasqueira, certo? Então joga um salzinho em cima da costela e coloca na churraca, de maneira que as labaredas não encostem na costela. Nem na sua e nem na do porco. Se você sabe o que fazer com a barriga, empurra com ela fatia ela em pedaços da espessura de uma caneta e coloca ela na grelha. Mas coloca beeem longe da labareda, porque a barriga perde muita gordura, que faz as labaredas ficarem encapetadas. Pra evitar um incêndio, deixa a barriga longe, de maneira que ela asse, mas demoradamente. De vez em quando, dá uma passada na churraca e tira as peças quando elas estiverem bem assadas, com cara de bem passadas. Quando a costela estiver OK, use uma faca e separe as costelas no osso, como se fosse servir. E tira esse olho gordo e essa mão boba daí, senão vai faltar costela na sua feijoada. Deixa isso tudo bem guardado num buraco na periferia de jalalabad.

Pensa no timing da coisa: você colocou as coisas na churraca, e não vai ficar ali de bobo do lado dela esperando ficar pronto enquanto tem uma trabalheira te esperando lá na cozinha, vai? Sim, vai Não, não vai, né? Então pensa que o procedimento abaixo pode ser feito durante o procedimento anterior. Uma verdadeira confusão, mas vai por mim que no fim dá certo.

O couve, parte 1
O couve é meio esquisito, mas é assim que a couve se chama. O couve. Nos tempos modernos, quando rapaziada muda de roupa, muda de time e valdemar vira valdirene, relaxa e chama a couve de o couve.  O que importa realmente é que você precisa lavar esse treco aí. Abre bem, separa as folhas, mete numa bacia cheia de água e com um gole de vinagre. Deixa lá por uma meia hora e vai fazer outra coisa. E não é playstation, é trabalho, merrrmão!

Por falar me trabalho, vamos inaugurar os trabalhos? Corra o mais rápido que puder até a sua geladeira, abra uma latinha de cerveja e fique mais feliz.

A farofa
Você deve cortar meia cebola em rodelas, o que é bem fácil. Nem vou te contar como fazer isso, você vai saber. Aproveita essa levada toda de picotar as coisas em rodela, e picota umas 5 azeitonas em rodela, se lembrando de retirar os caroços antes, sob pena de causar sérios danos à lâmina da sua faca. Picota também uns 3 dentes de alho, de qualquer jeito. Não precisa ficar muito bonitinho não, desde que esteja pequeno.Corra na churrasqueira e retire umas 2 fatias de barriga, mesmo que elas não estejam prontas. Picota a fatia em pedaços do tamanho de uma ervilha.
Pronto, agora vamos pra panela. Jogue uma golada de azeite na panela, bote pra esquentar. Na sequencia, jogue lá dentro os pedaços de barriga, e uma folha de louro. Mexa com uma colher de pau, senão as barrigas grudam no fundo da panela, e nós não queremos isso. Quando achar que tá ficando bacana, jogue também as cebolas e azeitonas em rodelas. O cheiro já começa a ficar complicado de segurar.. Mexe até que as cebolas comecem a ficar amarelinhas. Na sequencia, jogue o alho e mexa, até que o alho comece a escurecer um pouco. Agora, jogue a farinha, e mexa muito, sem parar. Por uns 20 segundos, depois você deve desligar o fogo. A farofa queima muito rápido, portanto é bom desligar. Experimente um pouquinho, e se achar que deve colocar mais sal, adivinhe: coloque mais sal. Feito isso, pode guardar a farofa num esconderijo numa mansão no paquistão.

O feijão, parte 1
Bom, vamos começar a cuidar do feijão, afinal de contas, isso aqui é uma feijoada e nós não estamos aqui pra enganar ninguém com uma feijoada sem feijão. Jogue o feijão todo numa panela de pressão, com o pé de porco, a orelha, o charque e o rabo, que já devem ter passado por todo aquele procedimento de lavagem. Ponha água até o limite de segurança da sua panela, feche e mande pro fogo por uma meia hora.

O couve, parte 2
Enquanto o feijão tá levando muita pressão [/bonde do tigrão], enxágue as folhas do couvão, junte todas, enrole e comece a cortar fininho. Entendeu como faz? Você tem umas folhas grandes e precisa fazer aquilo ficar como um macarrão, que é o jeito que o couve fica quando vai pra mesa. Usa a cabeça que você vai entender. Feito isso, picote uns 2 dentes de alho. Numa panela, jogue mais uma golada de azeite, e comece a fritar o alho. quando ele começar a mudar de cor, manda lá pra dentro todo o couve feito em tirinhas. Mexa bastante, e frite até ficar escuro e molenga. se precisar, manda mais azeite pra dentro. Quando escurecer e amolecer, jogue um pouco de sal e guarde nas cavernas do afeganistão.

A bisteca, parte 1
Num pote, esprema (JAMAIS inverta o P e o R de lugar, sob sério risco de acabar com a receita. Se fizer isso, nem me chama pra comer essa bomba) um limão, picote um dente de alho e dê uma colherada pequena de colorau, com umas pitadas de sal. Misture todo esse treco e mergulhe as bistecas.. feche o pote e chacoalhe como se não houvesse amanhã. Pensando bem, uma pitada de pimenta do reino deve ajudar essa mistura aí. Deixe descansar, por mais que o porco já esteja morto sem a menor necessidade de descanso. Enfim, você entendeu.

Nesse tempo, se a meia hora do feijão já passou, tudo bem. Deixa todo mundo fechado dentro da panela e segue os procedimentos.

O feijão, parte 2
O procedimento é abrir a panela tomando todo o cuidado do mundo com a pressão que tá rolando lá dentro. O ideal agora é você transferir tudo pra uma panela realmente grande, que caiba o dobro do feijão que você tem, ao menos. Feito isso, deixe a panela aberta no fogo médio até o final da receita toda. O lance da pressão é que ela ajuda a amolecer um pouco o feijão, mas todo o resto fica melhor em panela aberta. Põe bastante água nesse feijão e mexe de vez em quando, pro feijão não colar no fundo da panela.
O tempero do feijão é simples. Tenha em mãos, mas não necessariamente NAS mãos, uma cebola picotada, 4 dentes de alho picados, duas folhas de louro e o resto todo da barriga de porco cortada em pedaços pequenos. Numa outra panela, jogue uma golada de azeite e deposite ali as barrigas todas com as folhas de louro. Siga a sequencia das cebolas, alho e pronto. Quando todo mundo estiver bem fritinho, jogue na panela do feijão, com azeite e tudo.

Pescaria
Pode largar a varinha e a minhoca (ui), o lance agora é dar uma olhada no meio do feijão, e tentar resgatar o pé do porco. Isso porque ele tem muito osso, e nós não queremos que aquela tia bacanuda que gastou vinte mil reais na sua prótese detone a lustrosa dentadura com um pedaço de osso, certo? Portanto, é legal pescar o porco pelo pé, retirar toda a carne possível e jogar o osso fora.

O arroz
Ah, esse post já tá muito longo e eu não vou ensinar ninguém a fazer arroz. Pelo menos não agora. Dá seus pulos aí, parceiro, e prepara um arroz

Feijão, linguiças e costela
Com a panela aberta, você mexendo toda hora e aquele caldo começando a engrossar, hora de descobrir onde enfiar toda aquela linguiça. E antes que o leitor utilize o lado negro dessa mente putrefacta, as linguiças todas devem ser depositadas na panela do feijão, sem furar, sem abrir, sem fatiar. Linguiça inteira, compana. Manda pra panela, elas devem ficar pelo menos uma hora lá dentro. O mesmo pras costelas. Aliás, a costela tem uma tendência a desmanchar, e você pode deixar desamanchar mesmo, ou separar metade das costelas pra colocar só na hora de ir pra mesa.

O molhinho de pimenta
Essa parte fica em aberto. Muita gente põe a pimenta sozinha na mesa, muita gente faz um molho usando o caldo do feijão, mas eu vou ensinar um molhinho que eu acho porreta, receita da vovó (claro, né). Bom, picota meio maço de salsinha, espreme uns 6 ou 7 limões, e adiciona um pouco de pimenta vermelha. Só isso. Esse molhinho, quando jogado em cima do prato de feijoada, faz o palhaço chorar.

A bisteca, parte 2
Tamos quase lá, rapazeada. Tá acabando a trabalheira e tá chegando a hora da comilança. Aqui não tem segredo, é só fritar as bistecas até ficar bem passada. Na hroa de servir, joga em cima dela um pouco de salsinha e põe limão cortado na mesa.

Pronto, pessoal Acabou a saga. Agora é tirar tudo o que estava escondido por aí, colocar todo mundo na mesa e lavar a alma. O resultado é esse aqui:




Custo: Ah, é caro. Dependendo de onde você vai comprar, dá pra gastar mais de R$60,00 com esses ingredientes.
Tempo de preparo: Demora muuuuito. Só o feijão, fica no fogo umas 5 horas, fora o tempo pra tirar o sal do porco, churraca, enfim. Se você ficar bebendo cerveja o tempo todo, vai servir a feijuca em coma alcoólico. Toma cuidado com esse pé de cana aí, parceiro.
Rendimento: Dá pra uma galera. Já fiz feijoada pra 16 pessoas com esse volume de ingredientes.

    Receitas de panela: Arroz de coco quebra tudo

    Sempre disse por aí que arroz não é comida. Arroz é acompanhamento e olhe lá. E ainda digo mais: nunca fui um adepto dessa companhia aí.

    Arroz é como o miolo do pão: não serve pra nada, mas se você tirar o miolo de dentro do pão, vai ficar aquela sensação de que tá faltando alguma coisa. Imagina uma feijoada sem arroz, por exemplo. Não temos como discordar que fica meio perneta, não acha?

    Diante disso, admitamos que o arroz é sim necessário. Vietcongues, eu me rendo: tragam todo o arroz que conseguirem carregar, porque este blog volta às panelas pra preparar um arroz de coco que vai chutar bundas, romper as barreiras do imaginável e fazer o palhaço chorar.

    Um adendo importante: companheiro, escuta o que eu vou te dizer: mulheres gostam de caras que cozinham. Elas se derretem com aqueles que superam os limites da preguiça e baitolagem e metem a cara no fogão, preparam aquele jantar à luz de velas e mandam um Johnny Rivers na vitrola. Tá, nem precisa de luz de velas e vitrola, mas que elas curtem homem que cozinha, isso eu tenho certeza. E olha que eu sou casado há mais de 10 anos e não tenho a menor pretensão de sair por aí cozinhando e conquistando corações. Mas se funciona com a minha esposa - repito: somos casados há 10 anos, e a cada ano que passa, menos coisas que os maridos fazem arrancam suspiros das respectivas esposas - funciona com as garotas em geral. Anota isso, você pode fazer esse arroz pra sua vó ou pra sua mãe, mas também pode fazer pra uma garota, se dar bem e poder colocar no curriculo: "peguei uma garota na conta de um arroz". Repete comigo: ARROZ É COMIDA DE MULHERZINHA E É POR ISSO MESMO QUE A GENTE VAI FAZER. Beleza, escreve isso mil vezes e leia os parágrafos abaixo.

    Sem mais delongas, vamos à receita. Vou começar bem do comecinho, porque acho bastante provável que muitos dos leitores daqui saibam fazer milagres com uma churraca e um pedaço de boi, mas nunca fizeram um arroz.

    O primeiro passo é lavar umas duas xícaras de arroz. Sinceramente, não sei muito bem como fazer isso, então nas duas vezes que fiz, joguei o famoso migué na mulherada mais próxima e consegui que fizessem isso por mim. Pra falar a verdade, esse negócio de lavar tudo o que vem da horta é um saco, não acham? Um dia ainda vou me mudar pra um sítio no interior do nada, plantar eu mesmo os meus alimentos, só pra poder meter um brócoli na panela sem lavar, com a certeza de que não entupiram ele de agrotóxico, e que ninguém fez xixi no pé (do brócoli, não o seu próprio) durante a noite.

    Beleza, arroz lavado, deixa ele guardadinho aí. De preferência num escorredor apropriado, pra deixar o arroz bem seco. Vai te poupar umas queimaduras lá na frente, vai por mim.

    Agora você deve preparar uma cebola e meia. Ou uma bem grande. Ou duas pequenas. Você entendeu. Mas como assim, "preparar"? Eu não deveria picar a cebola e pronto? - Pergunta o curioso leitor. Olha, eu tenho feito arroz sem picotar a cebola e adorei a minha própria idéia. Pensa comigo: Você corta a cebola em rodelas, bem fininhas. Depois simplesmente separa as rodelas em sub-rodelas. Aí vai ficar com uma cebola transformada num monte de argolas. Pode pegar uma garrafa de cerveja, beber e depois brincar de arremessar as argolas nela.

    Pode, mas não deve. Porque isso não é brinquedo, é comida. Porque vai sujar a sua cebola. Porque vai fazer a casa inteira cheirar a cebola. Vai fazer você pagar o maior mico, jogando argola e chorando. Além de ser uma idéia absolutamente idiota (exceto a parte de beber a cerveja que é, na verdade, uma ótima idéia). Além do que, tá na hora de cuidar do alho, e se você ficar brincando com os ingredientes, não vai terminar a receita nunca.

    Então, larga mão de ser criança e picota bem pequeno uns 2 ou 3 dentes de alho. Deixa o alho separado num pires, não misture com a cebola. Ainda não.

    Próximo passo, tenha em mãos uma folha de louro. Se você imaginou tirar uma lasquinha do brad pitt, do paulo nunes ou do roberto leal, recomendo que saia daqui imediatamente e dirija-se ao www.globo.com/maisvoce, ou procure pelo programa do ronnie von. Se você pensou em mutilar o papagaio de pelúcia que conta piadas no programa matinal, chegou bem perto, mas ainda não é isso. Folha de louro é uma folha mesmo, um tempero deveras agradável, que vende em qualquer lugar que vende tempero. Na verdade, abre a gaveta dos temperos da patroa (ou da sua mãe, se você ainda não pulou na água fria) que você vai encontrar umas folhas lá dentro. Pega uma e guarda no bolso.

    Agora já estamos na hora de esquentar a barriga no fogão. Numa panela qualquer, jogue um litro de água, dois tabletes de caldo de galinha e tira o pé do chão, bota a mãozinha pra cima e bota pra ferver. Ok, quando ferver, você desliga o fogo e deixa ali quietinho.

    Hora do famoso refogado. Acenda o fogo e cubra com azeite extra-virgem o fundo de uma panela razoável (imagina que aquele arroz vai crescer, e você ainda vai jogar um monte de ingredientes na panela. Tem que caber). Quando eu falo de azeite extra-virgem, eu falo de azeite extra-virgem, compadre. Não é pra encher de óleo, nem pra botar aquele azeite fedido que você roubou na pizzaria rodízio. Tou te falando pra correr no mercado mais próximo, gastar R$10,00 e comprar um azeite decente. Ele, mais do que qualquer outro ingrediente, faz a diferença nas coisas que você cozinha. Ingrediente de qualidade = comida gostosa, já dizia o matemático oswald de souza. Não faça economia porca, dizia meu avô. Eu tenho aquilo roxo, dizia o ex-presidente fernando collor.

    Espere uns segundos e jogue uma rodela de cebola. Se fizer barulhinho, manda a cebola toda lá pra dentro, tire a folha de louro do bolso e mande lá pra fazer companhia à cebola. Munido de uma colher de pau, de um olho de vidro e de uma cara de mau, comece a mexer aquela coisa toda. Você vai notar que a cebola começa a ficar meio molenga e amarela. Tá fritando, camarada. Continua mexendo.

    Só pra sacanear, você pode jogar ali umas 2 pitadas de pimenta do reino preta. Ela vai misturar com a cebola e com a folha de louro, e faz o capeta na sua panela.

    A folha de louro, aparentemente, não serve pra nada. Mas é nessa hora de fritura que você começa a entender porque ela tá lá. Ela solta um cheiro agradável junto da cebola, e entenda que, em culinária, se cheira bem, o gosto é bom.

    Olha, pensando aqui com meus botões: umas duas folhinhas de manjericão também fariam um belo agrado nessa mistura, não acha? Vai por mim e manda duas folhas de manjericão pra dentro.

    Hora que estiver molenga pra mais, você pode jogar o alho. Abra uma pequena clareira na cebola, de maneira que você possa deixar o alho em contato com o fundo da panela. Deixe assim alguns instantes e pode misturar todo mundo. Na minha opinião, esse cheirinho é uma das coisas mais legais que tem na culinária de panela.

    A sua missão agora é fritar o arroz. Parece meio esquisito fritar aquele negócio cru, mas vai por mim que o caminho é esse. Joga o arroz todo lá dentro, e começa a mexer. Isso vai fazer com que o gosto do azeite, com cebola, alho, pimenta do reino e louro penetre no arroz. Assim, quando ele cozinhar, vai pegar esse gosto.

    Acabo de lembrar que ainda não abrimos uma cerveja. Faça um favor pra nós dois: vai na geladeira e abra uma cerveja. Dê um gole. Respire fundo. Agradeça a Deus pela inspiração dada ao ser superior que inventou a cerveja, reflita sobre a produção intelectual dos chimpanzés da Birmânia, tome outro gole e volte à receita antes que o seu arroz queime na panela.

    Agora vamos a um momento que parece uma insanidade, mas é o ponto máximo dessa receita: abra um vidro de leite de coco, e mande pra cima do arroz. Quando fiz essa receita, confesso que fiquei bastante ressabiado com esse lance, porque até então, eu só tinha usado leite de coco pra fazer batida, e sempre achei que aquilo era ingrediente de sobremesa. Mas logo me convenci de que nunca na história desse país, um leite de coco deitou tão bem numa panela de arroz.

    Com o leite de coco na panela, você deve mexer bem, enquanto termina aquela cerveja. Assim como a cebola, o azeite, o alho, a pimenta e o louro, o leite de coco vai ser absorvido pelo arroz, e isso tudo vai se transformar em benefício quando a garota colocar o garfo entre os dentes.

    Ok, misturou, tomou a cerveja? Agora vire toda aquela água que você ferveu com caldo de galinha. Misture um pouquinho e deixe acalmar. O nível de água precisa ficar uns dois dedos acima do arroz. Se não estiver, pode completar com água da torneira que funciona do mesmo jeito. Tampa a panela, abaixa um pouco o fogo.

    Tudo o que você tem que fazer é esperar. Abra mais uma cerveja e seja feliz. Abra outra e seja mais feliz ainda. Abra a panela pra ver o que tá acontecendo, abra sua mente e abracadabra: O arroz vai beber toda aquela água, enquanto você bebe algumas cervejas. É assim que funciona, quem mandou nascer arroz?

    Ao contrário da briga de marido e mulher, dessa vez você deve meter a colher. Faça isso, meta a colher de pau no meio do arroz, e verifique as condições do fundo da panela. Se não houver mais água, deve estar pronto. Experimente uma garfada. Se o arroz ainda parecer meio durango, pode jogar mais um pouco de água e voltar pra sua cerveja, se estiver macio, tá pronto.

    E, estando pronto, é só comer. O arroz.

    Dica: Você pode preparar uma farofa pra acompanhar, certamente fica bom. Veja a receita da leitora Angela, bem legal.

    Rendimento: duas xícaras de arroz rendem muuuuito. Dá pra chamar umas 5 pessoas pra comer, ainda mais porque sempre tem algum outro acompanhamento com o arroz.
    Custo: O arroz custa uns 3 reais, o pacote de 1kg, e você usa meio dele. Ingredientes diversos tem custo irrisório, e o leite de coco custou uns 2,50. Um prato barato demais.
    Tempo de preparo: Uma cerveja pra preparar os ingredientes, uma pra misturar todo mundo e duas esperando cozinhar. Tome rápido e faça a receita com 6 latas. Sirva feliz.

    Risoto de camarão: Quando o cozinheiro quebra a cara

    A casa caiu, negada. Fiz merda, pisei no tomate, peidei na farofa e dei bola fora. Tudo na mesma hora. Engoli seco e só não chorei de vergonha. Senão tinha chorado.

    Ao complacente leitor, peço encarecidamente que amoleça esse seu truculento coração, e me permita compartilhar o momento de profunda tristeza à qual sucumbi no final de semana último. No domingo, Dia dos Pais. Sente o drama...


    - fica tranquilo, dotô... nosso manobrista é dez, pode confiar!

    Eu sou casado. Logo, nesse dia, preciso cumprir duas obrigações de filho, uma com o meu pai, e outra com o meu sogro. No mundo ideal, eu passaria o dia com o meu pai, e a patroa com o pai dela. Mas como o mundo ideal é um negócio que só existe no filme do harry potter, a gente sabe que se fizer isso vai chatear papai pela ausência da patroa, e vai chatear o sogrão pela minha ausência. O que, aliás, seria uma sacanagem, já que os dois são pessoas da mais absoluta bacanice.

    Diante disso, ficou combinado que almoçaríamos com o sogrão, e jantaríamos com o meu pai. Para o sogrão, restaurante. Para o papai, eu faria a janta.

    Durante o almoço, tudo perfeito. Almocinho na beira da represa, solzinho na cabeça, cervejinha na cara e tudo transcorria normalmente. A sogra pediu uma picanha no rechaud, e o destino me colocou na ponta da mesa, para que ficasse com a incumbência de preparar a iguaria. Assim procedi, até que me toca o telefone. Era a Monica, minha irmã:

    ela: - e ae fii, belez?
    eu: - e ae monication, firme?
    ela: - então, o pai tá aqui comigo num churrasco na casa do sogro.
    eu: - fudeu.
    ela: - cuméquié?
    eu: - nadanão.
    ela: - e eu vou jantar na sua casa também.
    eu: - fechô.

    Então, caro leitor, é nesse momento que você descobre como funcionam as coisas e pensa: Assim acontece a merda. Eu teria que fazer uma receita de panela, e não um churrasco. Afinal, não poderia oferecer um churrasco a um pessoal que veio de outro churrasco. Não poderia fazer uma carne de panela, como a rabada, pra um pessoal que tava se empanturrando há pouco tempo atrás. Ou seja, eu teria que pensar numa comida leve, que não fosse carne. Aí que a porca torce o rabo, a pata traseira e um pedaço da orelha esquerda.

    Papai não viria sozinho. Papai viria com Dona Ivette, a nonna. Se você não sabe o que significa isso, eu vou te contar: Essa senhora, que me atende pela alcunha de VOVÓ, e por isso torna-se automaticamente mãe do meu pai, é a maior especialidade de toda a humanidade nos assuntos gastronômicos. De todos os tempos, de todos os países, de todas as avós, de toda a galáxia!!!!! Foi a Dona Ivette, com sua culinária Divina, que me ensinou a gostar de comer, e a absoluta destreza dessa senhora para com as panelas e outros instrumentos culinários transcende o conhecimento humano. Isso ficou claro? Ficou? Entendeu o tamanho da bucha que eu tinha nas mãos?

    Até aquele momento, estava tudo sob controle. Eu faria um churrasco com boas carnes bem preparadas e tudo ok. Eu sei que faço isso bem, e o mais importante: Dona Ivette não faz churrasco. Portanto, jamais passaria pela cabeça dela a frase "eu faço melhor". Ou seja: a situação era minha, e o universo conspirava a meu favor, como diria a mãe dinah. Mas bateu um vento errado, o universo conspirou contra, e a coisa toda se inverteu.

    Voltei pra casa tarde, precisando correr contra o tempo pra fazer alguma receita legal, executando com perfeição e em tempo recorde. Recorrendo à minha fraca memória, optei pelo risoto de camarão, que já foi postado aqui. Comecei os preparativos, e o que posto aqui servirá de lição aos que se interessarem em fazer esta receita.

    Comprei 1kg de camarão pequeno e limpo, e, como manda a receita, joguei num pote com caldo de limão. Aí aconteceu o meu primeiro, e maior erro: eu, no desespero de preparar aquele troço logo, não dei atenção à quantidade de limão. Digamos que eu deveria ter colocado o caldo de 2 limões, e eu coloquei uns 6.

    Na sequencia, deitei a cebola na tábua pra picotar. Isto findo, algum pensamento leviano da minha mente impura me convenceu de que eu precisava de mais uma cebola. Por algum motivo inexplicável, me deixei levar pela minha própria pegadinha e picotei mais uma cebola.

    Na hora do refogado, aquilo já me pareceu demais, mas ainda assim não dei ouvidos à parte sã da minha mente e meti todo mundo na panela.

    A receita transcorreu bem até o finalzinho, quando se precisa depositar o queijo parmesão. Que queijo parmesão? O queijo parmesão, oras... Eu havia esquecido o queijo, e não havia mais tempo pra comprar. A família, incluindo a Deusa das panelas, minha vó, estava ansiosa aguardando o risoto do Daniel, cuja fama já havia percorrido seus ouvidos. Maldição, vamos sem o queijo mesmo.

    Servi à mesa, a família fez os seus pratos salivando, fizemos um brinde e primeira garfada... detestei. O que eu poderia ter errado ali?

    Descobri, e vou te contar, mas não conta pra ninguém: Sabe porque o camarão deve ficar no limão, mesmo sabendo que vamos jogar o caldo fora e só o crustáceo entra na receita? Porque o sabor do limão penetra na carne do camarãozinho, e se você fizer isso com comedimento, vai deixar o seu risoto com um azedinho de fundo que fica uma delícia. Mas o animal que vos escreve exagerou no limão, e o azedinho virou um azedão. Se tivesse açúcar, dava pra fazer uma caipirinha com aquele camarão. E esse azedume todo matou completamente o sabor do camarão, do cogumelo, do tomate, de tudo mundo. Praticamente uma gangue de limões assassinos aniquilando todas as iguarias que eu coloquei naquela panela. A isso some-se uma quantidade desmedida, completamente desnecessária de cebola e temos aí um risoto de limão e cebola, quando deveríamos ter um saboroso risoto de camarão.

    Vovó disse que estava bom. Eu não acreditei. Acho que nem ela.

    Agora, só me resta aguardar o momento certo, pra fazer uma receita perfeita pra ela, e desfazer essa imagem ruim.

    Imagem essa, que só não ficou desacreditada porque vovó experimentou o meu sanduíche de pernil, cuja receita (ainda) não está neste blog, e elevou o pernil à estratosfera da produção gastronômica, com toda a humildade e modéstia que este escriba pode ter. Aguardem que eu ainda posto essa receita, ok?

    Vovó... você me perdoa?

    Receitas de panela: Risoto de camarão

    Eu nunca gostei muito de arroz. Quebrava o pau com a mãe quando eu era criança por conta disso. Pra mim, arroz sempre foi comida de vitecongue, e o coronel Bradock passou a minha infância dizendo que esses caras não prestavam. E, se o Chuck Norris em pessoa mete bala no vietcongue que come arroz, quem sou eu pra desafiar o cara?


    Vô queimá teu arroz, vietcong!

    Pensa comigo: Geral te chama pra uma feijoada. Pra que serve o arroz? Pra fazer o reboco com o feijão, mais nada. Você foi pra uma feijoada, e não pra uma arrozada. Geral te chama pro estrognofe, sabe lá Deus de onde veio esse nome. Quem tem gosto, cara, cheiro e nome? O estrogonofe, cazzo. O arroz tá lá só pra fazer reboco. É estrogonofe, e não arrozgonofe. Ninguém nunca vai te chamar "ow, véi... bora lá em casa comê um arrozão?". Se chamar, não vai. É roubada na certa.

    Mas alguma coisa me bateu na cabeça hoje que eu inventei de fazer o tal arroz no jantar. Cheguei em casa empurrando o esqueleto porta adentro, deixando a alma no elevador e a coragem na escada de incêndio. A patroa tava na cozinha, e como a fome já fazia meu estômago roer a ponta das costelas, começamos a discutir que ração deitaríamos na pança. Churrasco tava fora de cogitação por conta da chuva, então me veio à mente o tal risoto de camarão. Nunca fiz camarão na panela (só assado na churraca, e ficou bom), então revesti a carapaça de toda a coragem gastronômica e bora pra internet achar uma receita de risoto de camarão. Achei uma meia dúzia e, como sempre, li todas e chutei o que seria bom de uma e o que seria bom de outra.

    Aliás, essa é uma técnica maneira pra cozinhar: leia várias receitas diferentes do mesmo prato, você pode pinçar idéias excelentes. O google taí pra isso, parceiro. Sente só:

    A receita 1 diz que o contra-filé fica legal ao molho madeira.
    A receita 2 diz que o contra-filé fica legal fritinho na manteiga.
    A receita 3 diz que o molho madeira é feito de vinho.

    Você pode cozinhar o contra-filé com manteiga derretida e inventar um molho de vinho.
    A ana maria braga vai inventar um filé de madeira na manteiga de nozes, vai dar o vinho pro cachorro, decorar com a folhinha e assim se faz uma receita de sucesso!

    Voltemos aos vietcongues, sorrateiramente incorporados na minha arcada dentária. Eles me diziam pra correr ao supermercado mais próximo comprar todo o arroz que eu pudesse carregar. E eu, que não sou besta nem nada, joguei o famoso Migué na patroa e pedi a ela que preparasse um arrozinho enquanto eu comprava os camarõezinhos no mercado.

    Faço aqui um adendo importantíssimo: Se você acha que eu vou gastar meu teclado ensinando a fazer arroz, se enganou. Não se esqueça, eu não sou vietcongue, não sei fazer arroz, nem quero saber e tenho raiva de quem sabe. Portanto, faça como eu: dê um gato na sua mãe, irmã, vizinha ou na sua patroa, peça que façam uma panelinha de arroz pra você. Mais ou menos o que daria uns 3 pratos cheios, se você fosse bocó de comer só arroz.

    Voltei com 500 gramas de um camarãozinho honesto e limpinho. Na real, nem ligo muito se ele era um camarão honesto, mas limpinho é fundamental. Como você já deve ter ouvido, o camarão é um puta bicho porco e, dizem, come a merda no fundo do mar. Mas, se ele é porco porque come merda, eu sou porco porque torço pro Palmeiras e nóis tamo tudo no memo trem, então é limpinho que ele vai pra minha panela. Entendeu, compre o camarão mais barato que você encontrar e, limpo, sem cabeça e sem a bosta nas costas que aquilo é nojento.

    Pegue os 500g de camarão limpo e jogue num pote. Como em todas as receitas de cozinha, se prepare pra sujar muita louça (e ainda falam do churrasco. Fala sério, mulherada). Esprema junto aos camarões uns 3 limões, e deixe ali todo mundo quietinho. Qualquer um que já comeu um espetinho de camarão na praia sabe o quanto camarão e limão nasceram um pro outro. Como um nasce no mar e outro no limoeiro, cabe a você fazer funcionar o feitiço de áquila e unir os dois pombinhos. Então faça isso, jogue limão no camarão e deixe lá enquanto você prepara o resto.

    E preparar o resto inclui um monte de coisas, e você pode começar picando uma cebola. Nem precisa picar tão pequeninho quanto a cebola do hamburger de fraldinha, mas é bom não deixar aqueles tecões de cebola. Moral da história: picota uma cebola média e boa.

    Picota também uns 4 dentes de alho e guarda num pires. Picar alho (the best trocadilho EVER) não dá muito trabalho, mas deixa a sua mão um nojo. Se você pretende fazer um carinho numa garota, cuidado, essa receita pode te deixar solteiro.

    E, já que você se tornou o Picotão da noite, picote também um tomate grande, também conhecido como too much. Tá, piada infame à parte, picota esse tomatão ae e guarda em outro pote.

    Se pensa que a picotagem acabou, errou: dê o picote nuns 6 ou 7 champignons. Nem precisa ser muito pequeno, só não manda o cogumelão todo lá dentro pra não parecer uma fase do Mario Bros.



    We are the champions, beibê. Vai por mim.

    Agora você tem que fazer um caldinho de ervas. Escolha a erva de sua preferência, enrole e ria. Não, não, nada disso. Pra essa receita eu não usei erva nenhuma. Usei foi um tablete daqueles de caldo de carne, só que era de caldo de ervas. Ah, vai no mercado que você acha. Jogue, numa panela à parte, 3 tabletes do caldo de ervas com uma xícara de água e deixe dissolver. Guarda isso que você vai precisar.

    Tenha em mãos uma embalagem de queijo ralado. Como eu acho que a frescura dos ingredientes é o que faz uma comida gostosa, comprei um queijo e joguei um migué no amigo Gil, que ralou quase uma xícara de parmesão. Rala que rola, Gião.

    Depois de tanto preparativo, tava na hora de começar a cozinhar esse troço.
    Recapitulando:
    - Você tem uma panela de arroz te esperando?
    - Você tem um pote com uma cebola picada?
    - Tem uma xícara de parmesão e um amigo com o dedo ralado?
    - Terminou de picar alho?
    - Tem um camarão mergulhado no limão, achando que é caipirinha?
    - Tem um tomatão picotado num terceiro pote?
    - Tem cogumelos destruídos em Mario World?
    - Tem uma panela com um caldo de ervas derretido?
    Então você tá pronto, arrume uma panela grande. Prometo que é a última peça de louça que vamos sujar. Jogue nessa panela um pouco de azeite, o suficiente pra cobrir de leve o fundo da panela. Acenda o fogo. Em alguns segundos, o azeite esquentou e você pode jogar toda a cebola. A missão agora é mexer a cebola enquanto ela frita. E essa missão nem é difícil porque o cheiro é bom. Quando ela ficar amarelinho e parecendo transparente, tá frita. Hora de jogar o alho. Misture tudo um pouco.

    Enquanto frita ali, seja rápido: pegue o pote com o camarão, jogue fora o excesso de limão e manda todo mundo pra panela, junto com o alho e a cebola. Deixa eles ali, e mexe de vez em quando.

    Agora fica com aquele climão de que vai rolar uma decepção, mas não se preocupe: o camarão perde muita água, diminui de tamanho e aquilo fica parecendo uma pia de porco. Mas vai na fé que tá tudo certo.

    Hora dos tomates. Too much hour, como eles dizem lá. Taque todos na panela, e comece a mexer. Naturalmente, os tomates vão começar a se dissolver, e é nessa hora que a magia acontece.

    Ô loco, meu... Mais do que nunca, tanto no pessoal quanto no profissional, é a hora do Brasil inteiro curtir.... O CHAMPIGNON!!! Isso mesmo, ponha fogo no fausto silva mais próximo da sua residência e taque todo o champignon dentro da gororoba. Simples assim.

    Hora de aproveitar aquele caldo de ervas que ficou na outra panela e mandar lá pra dentro. Aproveite pra abrir mais uma cerveja. Tome a cerveja e fique um pouco mais feliz.

    Agora o seu trabalho é mexer. É como dançar o créu, tem que ter disposição. Mexe até aquele caldo começar a ficar encorpado. E o que é um caldo encorpado? É um caldo que não dá pra tomar de canudinho, simples assim.

    Cuidado, encorpado leitor: você está entrando na parte mais perigosa dessa receita. Teletransporte-se até Saigon, certifique-se de que Chuck Norris está dando roundhouse kicks bem longe de você, e taque a panela de arroz dentro do molho. Misture, enquanto veste um chapéu de palha pontudinho e um chinelo de madeira. Yankees go home e continuemos com a receita.

    Hora de lembrar dos amigos e jogar todo o parmesão que o trouxa, digo, amigo, ralou, na panela. Misture até o queijo sumir. Ele não some, mas derrete. Você entendeu.

    Não deixe assim por muito tempo, o arroz pode queimar, e nunca é bom desagradar os vietcongues. Jogue logo uma lata de creme de leite lá dentro, é ela que vai dar a liga, seja lá o que isso signifique.

    Nem precisa ficar bajulando muito não. Dá logo uma colherada lá dentro e veja como tá. Se você usou os 3 cubos de caldo pronto, deve estar bom de sal. Senão, adicione sal com a parcimônia que deus lhe deu e pronto: chama o povo pra comer.

    Não se preocupe se o seu risoto ficar parecendo uma pasta, é assim mesmo. O creme de leite dá uma melecada na parada, mas deixa muito legal. Confia que vai.

    Eu garanto: a trabalheira monstruosa que essa receita dá vale a pena. Além disso, é trabalhoso mas não é demorado, ao contrário da rabada.

    Custo: paguei 14 cruzeiros os 500g de camarão vermelho limpo. A lata de creme de leite deve custar uns 2 mangos e o resto é irrisório. Pratão bom e barato.
    Tempo de preparo: Tomei umas 3 brejas. Sirva feliz.
    Rendimento: 4 animais comeram isso. Ainda sobrou uma merreca e eu tou achando que vou terminar logo esse post e meter no microondas.